O projeto de lei 2.804/2024, proposto pelo senador Angelo Coronel (PSD-BA), que concede à Anatel e à Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) o poder de regular plataformas digitais no Brasil, tem gerado controvérsias no setor de telecomunicações.
O PL também atribui novas responsabilidades a Anatel e a ANPD. Em entrevista ao Tele.Síntese, Fábio Veras, ex-integrante do Conselho Consultivo da Anatel e membro do CNPD, acredita que o projeto traz um conceito normativo que vincula o serviço de telecom ao serviço das plataformas digitais.
Para ele, a discussão desse projeto ainda precisa ser aprofundada. “As plataformas digitais estão em limbo jurídico. Além disso, elas estão inaugurando o debate sobre a sua regulação, colocando a Anatel como ambiente institucional vinculado. Ou seja, a grande virtude do projeto, no momento, é que o Brasil possa fazer esse debate”, afirma.
Para Veras, o momento não é de discutir a escolha do regulador. “Temos que fugir de um debate de agências e aprofundar a discussão sobre competência normativa, e assim desenvolver uma regulação nacional”.
Conforme o projeto de lei que tramita no Senado, as plataformas digitais são: serviços de intermediação online; ferramentas de busca online; redes sociais online; plataforma de compartilhamento de conteúdos audiovisuais; provedor de serviço sob demanda; serviços de comunicações interpessoais; sistemas operacionais; serviços de computação em nuvem; serviços de publicidade online ofertados por operador das plataformas digitais previstas.
Mudanças para a Anatel e ANPD
De acordo com o PL, novas atribuições passam a competir tanto à Anatel quanto à ANPD, incluindo:
- Expedir normas quanto à exploração dos serviços de provimento de aplicações de internet ao público brasileiro, fiscalizando e aplicando sanções;
- Implementar, em sua esfera de atribuições, a política nacional da atividade de provimento de aplicações de internet ao público brasileiro visando o equilíbrio de sua exploração com o desenvolvimento das telecomunicações brasileiras;
- Compor administrativamente conflitos de interesse envolvendo o provedor de aplicação de internet, os usuários profissionais e/ou os prestadores de serviços de telecomunicações;
- Reprimir infrações dos direitos dos usuários;
- Exercer, relativamente ao provedor de aplicação de internet, as competências legais em matéria de controle, prevenção e repressão das infrações da ordem econômica, ressalvadas as pertencentes ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE
Medidas adotadas mundo afora
A Lei dos Serviços Digitais, também conhecida como Digital Services Act (DSA), é uma proposta legislativa da União Europeia que visa modernizar o quadro jurídico para plataformas online e serviços digitais. A principal intenção da DSA é estabelecer regras claras e uniformes para garantir a segurança, a transparência e a responsabilização das plataformas digitais, abordando questões como a moderação de conteúdo, a publicidade online e a proteção dos direitos dos usuários.
Entre os principais pontos da lei, destaca-se a obrigatoriedade das plataformas de remover rapidamente conteúdos ilegais e prejudiciais, além de fornecer relatórios regulares sobre suas práticas de moderação. A DSA impõe responsabilidades adicionais às grandes plataformas que atuam como gatekeepers no mercado digital, exigindo maior transparência em suas operações e nos algoritmos que utilizam para recomendar conteúdo e publicidade.
Essas medidas têm como objetivo não apenas proteger os consumidores e promover um ambiente online mais seguro, mas também fomentar uma concorrência justa e reduzir o domínio de gigantes tecnológicos. Ao padronizar a regulamentação digital em toda a União Europeia, a Lei dos Serviços Digitais busca equilibrar a inovação com a proteção dos direitos fundamentais dos usuários e a integridade do mercado digital.
Em relação ao PL brasileiro, Vanessa Souza, advogada especialista em crimes cibernéticos com atuação na Inglaterra, acredita que ele está alinhado a medidas adotadas por diversos países. Além disso, ela ressalta que a falta de regulamentação específica nos Estados Unidos tem gerado prejuízos tanto nos tribunais quanto na sociedade em geral, devido à dificuldade de lidar com leis antigas em questões tecnológicas.
“Nos Estados Unidos, embora não exista uma lei federal que regule a matéria, a Federal Trade Commission tem expandido algumas regulamentações. A ausência de leis específicas têm causado prejuízos não apenas nos tribunais, mas também na sociedade em geral. É muito difícil lidar com leis antigas em questões absolutamente novas, especialmente no campo da tecnologia”, opinou Souza.