Mais de uma centena de líderes debatem governança e partilha de recursos; secretário-geral abordará risco de ampliação de desigualdades globais e aprofundamento das divisões geopolíticas; chefe da OIT falou de preocupações e oportunidades para o futuro do trabalho.
Paris acolhe mais de 150 líderes na Cúpula de Ação de Inteligência Artificial coorganizada pelo presidente francês, Emmanuel Macron, e pelo primeiro-ministro indiano, Narendra Modi.
Nesta terça-feira, o segmento de chefes de Estado terá uma plenária sobre as principais ações comuns a serem tomadas na questão da inteligência artificial.
À medida que o presidente dos EUA, Donald Trump, ataca as medidas de proteção de IA de seu antecessor para promover a competitividade dos EUA, aumenta a pressão sobre a União Europeia para adotar uma abordagem mais leve em relação à IA para ajudar a manter as empresas europeias na corrida tecnológica.
Setor emergente e potências globais
No evento, que contará com a presença do secretário-geral da ONU, António Guterres, a meta é criar bases para a governança do setor emergente e o papel de lideranças globais na tecnologia em rápido desenvolvimento.
Na abertura, nesta segunda-feira, o diretor-geral da Organização Internacional do Trabalho, OIT, disse que atualmente a IA vem substituindo ações humanas, principalmente em empregos administrativos ocupados por mulheres de uma desproporcional.
Nesta Semana de Ação sobre a IA, a capital francesa receberá ainda vários eventos paralelos sobre o tema.
Falando no Grand Palais, na capital francesa, Gilbert Houngbo revelou que a categoria de empregos que serão automatizados e, portanto, perdidos, poderá contribuir para piorar a disparidade de gênero no pagamento entre homens e mulheres.
Com um olhar para o quadro mais amplo, o chefe da OIT crê que a grande preocupação não tem sido tanto em relação ao potencial de perda significativa de empregos apesar dos temores generalizados.
Medidas de proteção para funcionários
Para Houngbo, existem milhões de postos de trabalho que serão perdidos e muitos mais criados graças à IA. Ele ressaltou haver tendências atuais bastante positivas nesse sentido.
O diretor-geral alertou, no entanto, para “um risco de que esses novos empregos sejam menos pagos e, às vezes, com muito menos proteção para os funcionários, tal como aconteceu com muitos trabalhos da chamada “economia gig”. Nesse modelo laboral trabalhadores temporários ou freelancers são contratados para realizar tarefas específicas.
Aproveitando a IA para o Futuro do Trabalho
Na terça-feira, o discurso do secretário-geral da ONU aos líderes deverá focar na concentração de capacidades de IA em empresas e países e o risco de expandir as desigualdades globais e aprofundar as divisões geopolíticas.
António Guterres ressaltará a necessidade de evitar um mundo de ricos e pobres em IA e fazer um apelo em favor da cooperação entre os líderes do setor na partilha de conhecimentos.
A ênfase para os líderes governamentais e de tecnologia será para o compromisso em garantir proteções globais. Guterres deverá ainda se encontrar com representantes internacionais, incluindo o líder francês.
Brasil
Na Semana de Ação sobre a IA, a capital francesa receberá ainda vários eventos paralelos sobre o tema.
Na terça-feira, o Dia de Negócios terá sessões sobre IA e democracia. As discussões incluirão o impacto ambiental da tecnologia, a manipulação de informações e segurança cibernética e exibições de arte no local do evento.
O brasileiro Leonardo Santos, executivo da REAG Investimentos e conselheiro da Associação Brasileira de Inteligência Artificial (ABRIA), entidade que tem atuado ativamente na formulação do marco regulatório brasileiro de IA (PL 2358), ira participar de um dos painéis de discussão.
Como representante do Brasil na agenda restrita, Santos abordará o potencial do país e da América Latina na era da IA. Ele destaca que a matriz elétrica brasileira, com 89% de fontes renováveis, representa uma vantagem competitiva para a infraestrutura de data centers e processamento de IA. “Temos um verdadeiro ‘novo pré-sal’ em termos de capacidade computacional e geração de valor econômico. O Brasil pode se tornar um polo estratégico para essa revolução tecnológica.”
Outro ponto fundamental para Santos é a necessidade de uma regulação adaptada à realidade latino-americana. “Não podemos simplesmente copiar modelos europeus. Nossa juventude populacional e a urgência de crescimento econômico exigem uma abordagem regulatória contextualizada e ágil. A América Latina tem desafios e oportunidades únicas que precisam ser considerados.”
Ele também pretende destacar a relevância do Brasil em setores como finanças e saúde. Na sua avaliação, essa expertise pode tornar o país referência em aplicações práticas de IA na área de negócios e no setor público. “O PIX é um grande exemplo de como podemos inovar e liderar globalmente. No setor de saúde, soluções de IA devem levar em conta as especificidades regionais para serem eficazes. O Brasil já está demonstrando sua capacidade de desenvolver tecnologia de ponta com impacto real.”
Além disso, Santos acredita que a diversidade cultural brasileira é um diferencial na inovação em IA. “Nossa capacidade de integrar diferentes visões, culturas e formas de pensar nos torna altamente competitivos nesse setor. O multiculturalismo do Brasil pode ser um motor para soluções mais inclusivas e inovadoras.”
“O Brasil não pode ser apenas um espectador nesta revolução. Temos todas as condições para ser um hub de IA, exportando não apenas commodities, mas também capacidade computacional e expertise em setores estratégicos. Esta é uma janela de oportunidade para transformarmos desafios históricos em vantagens competitivas”, conclui Santos.
