Nos últimos anos, a migração para a nuvem parecia ser o Santo Graal da transformação digital. Empresas de diversos setores, movidas por diretrizes governamentais ou pela pressão da modernização, abraçaram o conceito de nuvem com entusiasmo. Uma pesquisa da PwC em 2023 revelou que 78% dos executivos entrevistados disseram que suas empresas adotaram a nuvem na maioria ou em todas as partes do negócio. No entanto, essa corrida para a cloud muitas vezes se mostrou precipitada e, em alguns casos, frustrante.
A primeira onda de migrações foi marcada pelo que o mercado chama de “lift & shift” — a simples transposição de aplicações e dados para a nuvem, sem grandes ajustes ou refatorações. A expectativa era de que essa transição trouxesse redução de custos e flexibilidade operacional. No entanto, muitas dessas migrações acabaram retornando, parcial ou totalmente, aos seus ambientes on-premises. Os motivos variaram, mas entre os principais estavam a soberania de dados e, acima de tudo, a falta de controle sobre os custos.
O mito da economia fácil foi desfeito rapidamente. Muitas organizações se deram conta de que a nuvem, ao contrário da percepção inicial, não era um “passe livre” para a redução de despesas. Custos inesperados com armazenamento, processamento e tráfego de dados, somados à necessidade de continuar gerenciando a infraestrutura legada, criaram um cenário mais complexo do que o esperado. O que era para ser uma solução, tornou-se um problema: empresas pagando muito mais do que previam e lidando com ambientes tecnológicos ainda mais fragmentados.
A realidade da nuvem pode ser comparada à experiência de um consumidor que cancela a TV a cabo para assinar o Netflix, acreditando que vai economizar. Mas, logo depois, ele percebe que ainda quer assistir a algo na HBO, na Amazon Prime e na Disney+. Quando vê, está gastando mais do que antes, com uma experiência ainda mais dispersa e difícil de gerenciar. Na nuvem, a analogia é a mesma: empresas acabam consumindo recursos de quatro ou cinco provedores diferentes, sem se desvencilhar totalmente da infraestrutura tradicional, o que eleva os custos e a complexidade.
Um exemplo claro desse aumento de complexidade pode ser observado nas estratégias multicloud. Enquanto a intenção de distribuir aplicações e dados entre diferentes provedores de nuvem visa evitar dependências excessivas, o resultado, muitas vezes, é o oposto: múltiplos contratos, ferramentas de gestão distintas e uma série de integrações necessárias para manter tudo funcionando. Sem uma plataforma unificada que suporte múltiplos ambientes, a promessa de flexibilidade se transforma em um emaranhado de desafios operacionais.
No entanto, também precisamos salientar os riscos associados à dependência de grandes fornecedores. A migração entre nuvens, especialmente quando envolve a transição entre diferentes plataformas, pode gerar custos proibitivos e até mesmo comprometer a continuidade dos negócios. O que deveria simplificar a gestão de TI, acaba por se tornar um novo ponto de vulnerabilidade.
Hoje, a ansiedade de migrar para a nuvem de qualquer maneira já passou. As empresas estão mais calmas, cautelosas e buscando estratégias mais sólidas. A nuvem híbrida, que combina o melhor da infraestrutura local com a flexibilidade da nuvem pública, desponta como uma solução viável para muitos. Além disso, a adoção de plataformas compatíveis com multicloud permite extrair o máximo de cada provedor sem cair na armadilha das dependências tecnológicas.
O que aprendemos com as migrações frustradas é que a nuvem, por si só, não é uma solução mágica. Ela exige planejamento, uma compreensão clara dos custos envolvidos e uma estratégia de longo prazo. A promessa de flexibilidade e economia continua válida, mas apenas quando implementada de forma cuidadosa e deliberada. A chave é extrair o melhor de cada ambiente, sem renunciar à governança e do controle financeiro.
Agora que a euforia passou, a verdadeira jornada para a nuvem começa.
Rafael Oneda, diretor de Tecnologia da Approach Tech.