Por: Marcelo Leite*
A resiliência das redes é uma exigência da sociedade atualmente. Entenda-se por rede absolutamente tudo o que envolve a tecnologia da informação: do funcionamento da Internet em si ao armazenamento de dados na nuvem. A ordem é ter acesso aos dados a que se deseja a qualquer momento, sem o risco de interrupção em uma atividade qualquer que esteja sendo realizada por meio de um terminal, seja ele um simples PC, um smartphone, ou qualquer outro tipo de dispositivo.
Para facilitar a compreensão é preciso lembrar que, no início da era da informática, os dados das pessoas e das empresas eram armazenados em discos rígidos, não sendo possível acessar as informações de qualquer lugar e a qualquer momento. A evolução fez surgir um novo conceito, o da nuvem, que ao contrário da tecnologia anterior, possibilita aos usuários, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas, o acesso às informações a partir de qualquer lugar do mundo, a qualquer momento e a partir dos mais variados dispositivos.
Sensacional, mas ainda uma solução imperfeita. E se a “nuvem contratada” apresentar problemas? Pensando nisso, foram desenvolvidas e implantadas soluções como o multi-cloud, em que a armazenagem se utiliza não de uma nuvem, mas de várias, como nuvens públicas, nuvens privadas ou nuvens híbridas. É a tendência atual no que diz respeito à armazenagem de dados, e a tecnologia garante um bom custo/benefício, já que o uso e a troca de plataformas pode ser feita de maneira simples.
O local de armazenagem e as chaves de acesso a ele não são únicos na arquitetura do ambiente da tecnologia da informação. O acesso aos dados “estocados” nas nuvens também exige boas estradas virtuais. Essas estradas nada mais são do que os sinais transmitidos pela Internet. Por exemplo, via satélite, ou por fibras óticas. São esses sinais os responsáveis para que uma senha digitada em um celular no Brasil dê acesso a um documento armazenado em uma nuvem nos Estados Unidos. A velocidade da resposta ao comando do usuário depende muito da qualidade ou da latência do sinal.
Um “fenômeno” parecido com o multi-cloud começa a criar corpo e importância na comunicação via satélite, resultado do surgimento dos satélites de baixa órbita, que estão se popularizando cada vez mais. Uma das vantagens dos satélites de baixa órbita é que eles estão mais próximos da superfície terrestre, permitindo que o comando chegue mais rápido e o tempo de resposta seja menor. Então, muitas empresas ao redor do mundo começaram a usar sistemas de Internet baseados em satélites de baixa órbita. Acontece que velocidade não é tudo. E se acontecer algum problema? Tomando como exemplo o imbróglio entre a Justiça brasileiro e o megaempresário Elon Musk, como ficariam os usuários da plataforma Starlink se ela fosse completamente bloqueada por determinação do Superior Tribunal Federal (STF)? Não só isso, problemas de todos os tipos podem resultar em falhas dos sinais, cujo tempo para ser resolvido muitas vezes é imprevisível.
Empresas e pessoas já não podem mais ficar muito tempo sem conexão, pois isso causaria transtornos e muitos prejuízos. Como resolver isso? Questões desta monta fizeram surgir uma nova era, a da multi-órbita, em que é possível contar com os serviços de satélites de baixa, média e alta órbita em uma única plataforma. Assim, as empresas passam a dispor de uma resiliência bem mais confiável e praticamente à prova de incidentes.
Infelizmente esse novo conceito ainda não está disponível a todos. Essa “nova era” está mais para “nova tendência” por questões de adaptações ainda necessárias. Mas já existem exemplos de empresas de vários ramos de atividades adotando este novo modelo. No momento, principalmente nos Estados Unidos, as utilizações de multi-órbita aparecem dentro de segmentos premium como aviação governamental e executiva, navegação, Óleo e Gás, passando pelo setor militar/defesa. Em geral, são aplicações críticas em mercados que não podem depender de uma única rede e que também não têm espaço físico para comportar múltiplos sistemas.
A exigência é de redundância plena e um único terminal capaz de alternar instantaneamente entre órbita terrestre baixa (LEO), órbita terrestre média (MEO), órbita geoestacionária (GEO) e órbita altamente elíptica (HEO) e redes terrestres. Esses terminais multi-órbita que estão chegando ao mercado têm design elegante, ocupam pouco espaço e contam com uma capacidade enorme. A popularização deste modelo ao redor do mundo deve levar algum tempo ainda por uma questão de ordem técnica.
Vamos pegar como exemplo os aparelhos de telefonia celular. Os fabricantes investiram e hoje a interoperabilidade entre os diferentes sistemas usados nos países é uma realidade. Um celular comprado no Brasil para o sistema daqui pode funcionar sem problemas em outros países da América, da Europa ou dos demais continentes. Mas quando o assunto é satélite, a história muda. Os fabricantes dessas ‘engenhocas’ ainda não investiram nessa interoperabilidade.
Certamente isso mudará com o passar dos anos, mas tudo indica que antes disso as soluções multi-órbita vão se expandir por conta do desenvolvimento de soluções capazes de contornar essa limitação dos sistemas de satélite. Tais plataformas funcionam de forma semelhante a softwares do tipo SaaS fazendo o papel de interoperabilidade.
E o melhor de tudo é que a tecnologia desenvolvida visa tirar do usuário qualquer tipo de preocupação com o momento da mudança de um sistema de satélite para o outro. Tudo ocorre de forma automática, sem que a pessoa que esteja operando saiba de fato o que está acontecendo. Basta ligar e usar. Vale a pena ficar atento a esta nova tendência. Ela faz tanto sentido que talvez seja o melhor ou único caminho a ser seguido por quem não pode perder um milésimo de segundo sequer.
* Marcelo Leite, Strategy & Portfolio Director da Sencinet