Diante da crescente evidência de que as mudanças climáticas são uma realidade incontestável, o IAF – International Accreditation Forum e a ISO – International Organization for Standardization emitiram um comunicado conjunto destacando a importância de considerar os efeitos desse fenômeno nas questões internas e externas que possam influenciar a eficácia dos sistemas de gestão organizacional. O objetivo do comunicado foi enfatizar que diversas normas ISO (conforme indicado na tabela I) serão revisadas por meio de emendas, visando integrar a necessidade de as organizações incorporarem os impactos das mudanças climáticas em seus respectivos sistemas de gestão.
Tab. I – Normas de sistema de gestão que terão emendas sobre mudanças climáticas. (Fonte: DC-0622_24 – ABNT)
ISO 9001: 2015 | Sistemas de gestão da qualidade — Requisitos |
ISO 14001:2015 | Sistemas de gestão ambiental — Requisitos com orientações para uso |
ISO 45001:2018 | Sistemas de gestão de saúde e segurança ocupacional — Requisitos com orientações para uso |
ISO 21101:2014 | Turismo de aventura — Sistemas de gestão de segurança — Requisitos |
ISO / IEC 27001:2022 | Segurança da informação, cibersegurança e proteção da privacidade — Sistemas de gestão da segurança da informação — Requisitos |
ISO 14298:2021 | Tecnologia gráfica — Gestão de processos de impressão de segurança |
ISO 37101:2016 | Desenvolvimento sustentável nas comunidades — Sistema de gestão para o desenvolvimento sustentável — Requisitos com orientação para uso |
ISO 37001:2016 | Sistemas de gestão antissuborno — Requisitos com orientação para uso |
ISO 37301:2021 | Sistemas de gestão de conformidade — Requisitos com orientação para uso |
ISO 39001:2012 | Sistemas de gestão da segurança rodoviária (RTS) — Requisitos com orientações para utilização |
ISO 22000:2018 | Sistemas de gestão da segurança alimentar — Requisitos para qualquer organização da cadeia alimentar |
ISO 50001:2018 | Sistemas de gestão de energia — Requisitos com orientações para uso |
ISO / IEC 20000 1:2018 | Tecnologia da informação — Gestão de serviços — Parte 1: Requisitos do sistema de gestão de serviços |
ISO 21001:2018 | Organizações educacionais — Sistemas de gestão para organizações educacionais — Requisitos com orientação para uso |
Uma abordagem eficaz para mitigar o impacto das mudanças climáticas no processo produtivo das organizações é a implementação de uma gestão adequada dos riscos associados a esses fenômenos. Tal gestão permite a identificação, avaliação e mitigação sistemática dos efeitos adversos que as alterações climáticas podem ocasionar nas operações empresariais, promovendo maior resiliência organizacional.
Recomendações para minimizar os efeitos ambientais em laboratórios de ensaio e calibração
Um exemplo prático pode ser observado na semana mais crítica de setembro, na cidade de São Paulo, quando as temperaturas atingiram níveis elevados e a umidade relativa do ar estava excepcionalmente baixa. No Laboratório de Metrologia Elétrica do IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas, identificou-se que um sensor de potência de RF – radiofrequência pertencente a um cliente apresentava avarias. Embora o instrumento estivesse operacional nas dependências do cliente, verificou-se a possibilidade de que o dano tenha ocorrido durante o transporte entre o cliente e o Instituto, possivelmente em decorrência de uma descarga eletrostática, visto que o instrumento estava inadequadamente embalado, utilizando apenas plástico-bolha.
Esse incidente ressalta a importância de reavaliar os procedimentos operacionais à luz das mudanças climáticas, uma vez que essas alterações têm impacto direto na rotina dos profissionais que atuam com instrumentos de medição de alta precisão. A seguir, apresentam-se algumas recomendações que podem ser integradas à gestão de riscos de laboratórios que lidam com instrumentos de medição:
- Adequação da infraestrutura de controle térmico. Em condições de temperatura elevada, é fundamental que o laboratório disponha de sistemas de ar condicionado com capacidade aumentada. No entanto, tal medida implica um acréscimo no consumo energético. Portanto, alternativas como a redistribuição da carga térmica e o uso de materiais isolantes em telhados e paredes devem ser consideradas como formas de mitigar esse aumento de consumo.
- Prevenção contra descargas eletrostáticas. Baixos níveis de umidade aumentam consideravelmente o risco de descargas eletrostáticas, que podem comprometer a integridade de dispositivos sensíveis. Assim, torna-se imperativo reforçar a atenção no manuseio, armazenamento e transporte de instrumentos susceptíveis a esse tipo de interferência. O uso de embalagens antiestáticas é essencial para o armazenamento e transporte desses equipamentos.
- Planejamento com base em previsões meteorológicas. Manter-se informado sobre as condições climáticas previstas para os dias subsequentes pode ser uma estratégia eficiente na tomada de decisões relacionadas ao transporte de instrumentos críticos ou à execução de serviços em campo.
- Consideração das condições ambientais nas medições. As variações ambientais, especialmente de temperatura, podem impactar diretamente a precisão das medições realizadas. A ocorrência de variações bruscas de temperatura pode resultar em erros significativos nas medições, o que demanda um planejamento rigoroso para minimizar esses impactos.
- Desenvolvimento de políticas de transporte seguro. Para além do uso de embalagens antiestáticas, é recomendável que laboratórios adotem procedimentos de transporte mais robustos, incluindo o uso de veículos com controle de temperatura e umidade, quando necessário. Garantir que as condições climáticas durante o transporte sejam adequadas reduz o risco de danos aos instrumentos.
- Treinamento contínuo da equipe. A capacitação dos profissionais que atuam no manuseio, armazenamento e transporte de instrumentos é essencial. Um treinamento contínuo e atualizado pode garantir que todos os colaboradores estejam cientes das melhores práticas e dos riscos envolvidos, especialmente em contextos de mudanças climáticas.
- Desenvolvimento de protocolos de resposta a emergências ambientais. Criar protocolos de contingência que possam ser acionados em emergências, como falhas no sistema de ar condicionado ou aumentos repentinos na umidade ou temperatura, ajuda a minimizar os riscos de danos aos instrumentos e assegurar a continuidade das operações do laboratório.
Em conclusão, o impacto das mudanças climáticas sobre as operações de laboratórios de ensaio e calibração, assim como sobre os sistemas de gestão das organizações, é uma realidade cada vez mais presente e inescapável. A variabilidade climática, expressa em eventos extremos de temperatura e umidade, impõe novos desafios que exigem uma adaptação sistemática e criteriosa, tanto no que se refere às infraestruturas laboratoriais quanto aos procedimentos de transporte, armazenamento e manuseio de instrumentos sensíveis.
A inclusão das questões climáticas nas normas ISO é uma clara evidência de que as organizações globais estão reconhecendo a necessidade de integrar essa nova variável em seus sistemas de gestão. A revisão dessas normas representa um passo crucial na construção de uma resiliência organizacional diante das mudanças climáticas, reforçando a necessidade de monitoramento contínuo das condições ambientais, treinamento adequado das equipes e implementação de tecnologias avançadas para proteção dos instrumentos e mitigação de riscos. Dessa forma, as organizações estarão mais preparadas para enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas, minimizando os impactos em seus processos produtivos e assegurando a eficácia e a confiabilidade dos seus resultados.