No final de junho, a Lei nº 14.478/2022, também conhecida como Marco Legal de Criptomoedas, completou um ano de vigência. Segundo um estudo recente da Ripple, em parceria com o Laboratório de Políticas Públicas e Internet (Lapin), o Brasil se consolida como um dos países pioneiros na regulamentação de criptoativos. O relatório coloca o país em um “grupo seleto” de nações com estrutura jurídica para o segmento.
Na visão de Julia Rosin, líder de Políticas Públicas na Bitso Brasil, empresa de serviços financeiros baseados em cripto, as normas jurídicas estabelecidas até agora são, em sua maioria, necessárias para garantir um ambiente seguro e transparente para os investidores e usuários de criptoativos. “No entanto, é crucial que a regulação não se torne excessivamente restritiva, de modo a não sufocar a inovação”, afirmou em entrevista ao DMI, portal de informação sobre o sistema financeiro digital e de crédito do Tele.Síntese. Leia a íntegra.
DMI: Na sua atuação na Bitso Brasil você tem o papel de participar de discussões sobre a regulação do setor de cripto no país. Como avalia esse campo de discussão e a interação com os órgãos reguladores?
Julia Rosin: Minha avaliação é bastante positiva, uma vez que há uma crescente disposição dos órgãos reguladores em compreender e colaborar com a indústria de criptoativos.
A interação com o Banco Central e a CVM tem sido produtiva, permitindo um diálogo construtivo para criarmos regulamentações equilibradas e que beneficiem tanto os consumidores quanto os provedores de serviços financeiros baseados em cripto.
Além disso, vemos cada vez mais empresas participando do debate, principalmente dentro das associações, e preocupadas em operar de forma a proteger os usuários e combater fraudes.
DMI: O Banco Central lançou, em dezembro, uma consulta pública com integrantes dessa indústria, para obter contribuições sobre a regulamentação do mercado de ativos virtuais. A consulta recebeu comentários até janeiro. Qual a importância disso?
Julia Rosin: A consulta pública lançada pelo Banco Central é de extrema importância, pois representa um passo crucial para a construção de uma regulação inclusiva e bem-informada.
Esse tipo de consulta permite que os participantes do mercado forneçam insights valiosos sobre as necessidades e os desafios do setor, garantindo que as futuras regulamentações sejam baseadas em uma compreensão real das operações e dinâmicas do mercado de criptoativos. Além disso, promove a transparência e o diálogo aberto entre a indústria e os reguladores.
DMI: Em junho, a Lei nº 14.478/2022, considerada o Marco Legal das Criptomoedas, uma iniciativa que coloca o país entre aquelas poucas com estrutura jurídica para o segmento, completou um ano de vigência. Como você avalia a entrada em vigor dessa lei?
Julia Rosin: Como um todo, a legislação é bem positiva. Ao mesmo tempo que já estabeleceu diretrizes importantes como a definição de licenças para o funcionamento das exchanges e a possibilidade de que um consumidor lesado acione empresas estrangeiras, deixou em aberto especificidades técnicas que estão agora sendo construídas em conjunto com o setor e com os órgãos reguladores.
Essas medidas ajudam a prevenir que instituições atuem de maneira indevida no país, sem oferecer o devido respaldo jurídico, ampliando a segurança e confiabilidade do sistema. Além disso, permitem uma ampla participação do setor na criação de regras de conduta, sem inibir a inovação inerente à tecnologia.
DMI: As normas jurídicas até agora são em número razoável ou elas atrapalham a inovação?
Julia Rosin: As normas jurídicas estabelecidas até agora são, em sua maioria, razoáveis e necessárias para garantir um ambiente seguro e transparente para os investidores e usuários de criptoativos.
No entanto, é crucial que a regulação não se torne excessivamente restritiva, de modo a não sufocar a inovação. Um equilíbrio cuidadoso deve ser mantido para assegurar que a legislação proteja os consumidores e, ao mesmo tempo, permita que a indústria continue a evoluir e inovar.
DMI: O mercado ainda aguarda a criação de licenças para empresas que operam com criptomoedas, as chamadas VASPs. Qual a expectativa em torno disso?
Julia Rosin: A criação de licenças específicas para empresas que operam com criptoativos é vista com bons olhos, pois pode aumentar a credibilidade e a confiança no mercado. A expectativa é que o Banco Central publique uma prévia em formato de Consulta Pública em setembro deste ano, com previsão para publicação oficial no início de 2025.
O objetivo é que elas proporcionem uma maior segurança para os consumidores, estabelecendo critérios claros de operação e exigências de compliance para as empresas. Além disso, pode contribuir para a profissionalização do setor, incentivando as melhores práticas e o desenvolvimento de soluções inovadoras e seguras.
DMI: Também falta a regulamentação das stablecoins. É algo esperado pelo setor?
Julia Rosin: A regulamentação das stablecoins é um tema de grande relevância, dado o seu potencial para proteger os investimentos de desvalorização da moeda e facilitar transações, especialmente em pagamentos internacionais. É um tópico que também está na agenda do Banco Central para ser debatido ainda este ano. Estamos trabalhando para que essa regulamentação aborde questões como a transparência, reserva de valor e a proteção dos consumidores para ajudar a mitigar riscos associados a esses ativos, ao mesmo tempo que permite que seu potencial de inovação e eficiência seja realizado.