Por Hermano Pinto (*)
Historicamente, as grandes inovações tecnológicas que impactaram os processos industriais foram as máquinas a vapor (1.0), a energia elétrica (2.0) e a automação (3.0). Passadas várias décadas de crescente automação e robotização das indústrias, qual o motivo para tanto se falar da Indústria 4.0 e qual o estágio em que nos encontramos neste novo momento da ampla revolução industrial iniciada no século XVIII?
Esta nova etapa da busca por mais eficiência e produtividade passa pela adoção de tecnologias de sensores inteligentes, conectividade omnipresente e sistemas embarcados com tecnologias disruptivas como IA, gêmeos digitais e AR/VR/MR para que possamos ter mais máquinas integradas e conectadas, além dos limites do chão de fábrica, trocando informações entre si e com a cadeia de suprimentos, chegando até ao consumidor.
Como em toda etapa da revolução industrial por que já passamos, ocorrem questionamentos e barreiras para que a sustentabilidade dos efeitos desta transformação digital possa ser realmente percebida através da maior agilidade, eficiência e confiabilidade das operações.
Se a revolução dos anos 60, representada pela automação das linhas de produção e adoção em larga escala de robôs para muitas atividades repetitivas e de precisão trouxe um amplo crescimento da eficiência operacional, quais são os elementos que serão profundamente impactados por esta nova revolução da conectividade e da inteligência das máquinas?
Basicamente, estamos falando de processos industriais mais resilientes e seguros, menores períodos de interrupção e de manutenção, maior responsividade frente a fatores exógenos como demanda e influxo de matérias-primas, além da governança sobre elementos associados ao meio-ambiente, à descarbonização de processos e ao uso eficiente de recursos naturais.
No Brasil, a rede 5G de frequência privativa, reservada pela Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) é de 3,7 a 3,8 GHz, com necessidade de baixa potência e em ambiente confinado. De acordo com a Agência, essa decisão considera a necessidade de otimizar o uso das faixas de radiofrequências e a crescente demanda de espectro para uso de tecnologias 5G por redes privativas em soluções de automação industrial (Indústria 4.0). Esse passo é decisivo para que a evolução tão esperada chegue, de fato, a todas as regiões e modelos de produção no Brasil.
Desafios de Integração
As indústrias constituem redes altamente complexas em termos de gestão. Dados de 2021 indicam que já existiam mais de 25 bilhões de elementos conectados (IoT), com relevantes pontos cegos na gestão de ativos e de estoques. É nesse contexto que residem os vários desafios de integração entre Tecnologia da Informação (TI), responsável pelas plataformas de comunicação e dados, e a Tecnologia de Operação (Operation Technology – OT), responsável pela automação para dentro da fábrica.
A revolução 3.0 ocorreu graças ao amplo desenvolvimento das áreas de engenharia de automação de chão de fábrica, ou de tecnologia operacional (OT) que desenvolveram e implantaram com amplo sucesso os modelos centrados nos PLCs (Programmable Logic Controllers), que, por meio de memórias programáveis, possibilitam armazenar instruções previamente definidas pelo usuário em suas configurações, o que indica a centralidade do controle das próprias máquinas para a operação industrial.
As novas tecnologias de conectividade e inteligência embarcada impõem, entretanto, novos desafios a este importante legado existente nas indústrias, tais como a visibilidade e transparência entre dispositivos e dados, uma rede de máquinas e sistemas conectada com roteadores, comutadores e elementos de borda em nuvem, além de projetos desenhados com premissas de segurança cibernética e de interatividade sistêmica fora do ambiente intrínseco ao condomínio fabril.
Este “mundo novo” é amplamente dominado pelas equipes de “Tecnologia da Informação” (IT), que já se fazem presentes no ambiente industrial em várias etapas, entretanto “de forma acessória”, pouco associadas aos processos industriais centrais, o que impõe um novo diálogo e uma maior integração entre as áreas de IT e OT.
Áreas de Desenvolvimento
Em conversas com empresas de diferentes maturidades, podemos relacionar três grandes áreas de desenvolvimento:
A aceleração de redes privativas e de acessos de borda em nuvem torna-se primordial, uma vez que sistemas WiFi industriais atendem as necessidades básicas de conectividade e comunicação das plantas legadas, porém novos parâmetros de cobertura, latência, segurança e confiabilidade se impõem para a transformação digital pretendida não seja prejudicada.
O uso ampliado de tecnologias no espaço virtual e de interação físico-virtual, como BIM, AR/VR/MR e gêmeos digitais representam ferramentas essenciais para o planejamento de operações integradas de chão de fábrica com as novas demandas que se impõem de segurança, flexibilidade de reconfiguração, previsibilidade e de integração de cadeias de produção e suprimento. Hoje, indústrias automobilísticas na Alemanha já planejam suas plantas com estas novas ferramentas, fazendo uso de um metaverso próprio que permite simular a eficiência dos fluxos de matéria-prima e produtos acabados, bem como da adequabilidade das plantas para os operários, observando novos padrões de ergonomia e segurança ampliada do trabalho.
Sustentabilidade energética e descarbonização tornaram-se elementos fundamentais para a governança das empresas perante a sociedade e aos seus acionistas. Redes integradas pelas novas tecnologias de conectividade e interação demonstraram grande potencial para os processos de transição energética, controle integrado de resíduos e o uso ampliado de contingências e prevenção a acidentes.
Portanto, a adoção de redes privativas em 5G se apresenta como uma opção fundamental para auxiliar as empresas em suas necessidades mais críticas, seja sobre segurança de dados, segurança da força de trabalho ou melhoria da automação de processos, ainda que haja alguma resistência, uma vez que as funcionalidades compromissadas não estejam totalmente disponíveis. Definitivamente, o maior recurso do 5G não será atuar como “um tubo de conectividade”, mas como uma rede de comunicação massiva de dispositivos em baixa latência (URLLC: Ultra-Reliable Low Latency Communications) com acesso múltiplo de borda (MEC: Multi-access Edge Computing).
Diante disso, fica claro como as redes privativas 5G irão acelerar a adoção de plantas mais integradas, sustentáveis e confiáveis, com requisitos rigorosos e onde desempenhos aprimorados tenham impactos significativos. No entanto, ainda que este mercado esteja apenas dando os seus primeiros passos e o total suporte a essas soluções descritas passe pela implantação do 5G SA (standalone) e futuramente das redes 5G com frequências milimétricas (26 GHz), é fundamental iniciarmos desde já a construção de um ecossistema ciente das potencialidades e do legado de investimentos existentes, assim como uma parceria efetiva entre as áreas de OT e IT para preencher a lacuna existente entre o mundo da conectividade e o da vertical de indústria.
Sendo o Brasil um país grande e repleto de contrastes, também serão encontrados diversos estágios, tipos e níveis de realidades operacionais, o que irá impor a adoção de soluções específicas e alinhadas com o nível de maturidade das empresas, valendo salientar, que as redes privativas 5G serão também instrumentos fundamentais para o desenvolvimento de outras áreas como Logística, Mineração, Varejo, Cidades Inteligentes e o Agronegócio.
(*) Hermano Pinto é Diretor do Portfólio de Tecnologia e Infraestrutura da Informa Markets, responsável pelo Futurecom, maior evento de tecnologia, telecomunicações e transformação digital da América Latina.
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